sábado, 20 de julho de 2013

Sobre as tentações curtas e passageiras




CAPÍTULO V

SOBRE AS TENTAÇÕES CURTAS E PASSAGEIRAS


Geralmente, as tentações são percebidas apenas começam, ou logo depois, e podem agir diferentemente. As vezes são pensamentos, sentimentos, que se apresentam subitamente e que não fazem mais do que passar. Então, muitas vezes fica-se embaraçado para discernir se foi uma simples tentação ou um pecado. Embora nos tenhamos desviado dela, estamos em dificuldade para julgar se nesse curto intervalo de tempo fizemos isso bastante cedo para prevenir o consentimento.

Nesta circunstância, podemo-nos decidir com base nos nossos próprios sentimentos e no nosso procedimento comum. Uma pessoa que estima, que ama, que pratica com vigilância as virtudes contra as quais teve essas tentações; que, pela disposição habitual do seu coração, está afastada de toda falta voluntária contra essas mesmas virtudes; que, nas ocasiões em que teve tentações mais seguidas nesse gênero, combateu para não sucumbir, pode prudentemente julgar que essas idéias, esses sentimentos passageiros não são falta, porém inicialmente tentações, e que a desaprovação que as fez desaparecer se antecipou ao consentimento.




A razão disso é que, quando uma alma age contra os sentimentos que ordinariamente segue e contra o hábito que contraiu, faz a si uma espécie de violência da qual não é fácil deixar de se dar conta. Se, na disposição em que a suponho, ela tivesse dado algum consentimento à tentação, não o ignoraria, não duvidaria disso: a impressão, embora passageira, ter-se-ia feito sentir o bastante para se fazer notar. Devemo-nos, pois, tranquilizar nessas ocasiões pelo simples fato de não estarmos seguros de haver consentido na tentação. Então a dúvida é uma certeza: se se houvesse realmente consentido, não se duvidaria.

No caso dessas idéias passageiras, todos os que dão às almas tentadas regras de conduta convêm unanimemente em que se devem desprezar essas espécies de tentações; e que se lhes deve dar o menos de atenção possível. A razão que eles dão disto é fundada na experiência. Esta nos ensina que, se as desprezamos, se as deixamos passar, ocupando-nos de outras coisas, elas voltam mais raramente, ou mesmo não voltam mais; que, ao contrário, se com elas nos chocamos de frente, se lhes damos uma atenção séria por exames inquietos, mormente se o temor as acompanha, elas tinham passado e as tornamos a chamar, detêmo-las, damos-lhe uma nova força pelo estágio que elas fazem na alma. Aquilo que não passava de uma sombra que se desvanecia num instante, de um relâmpago que desaparecia num momento, pelo desprezo que dele se fazia, toma consistência pela atenção que se lhe dá, torna-se um fogo que aumenta pela
reflexão. E então é um inimigo que teve tempo de se fortificar, que se encarniça no combate, e que põe a alma em perigo.

Dá-se com a tentação o que se dá com um inimigo tímido: por assim dizer, ele se ensaia com o seu adversário; se encontra contemporizações tímidas ou um temor pusilânime, aproveita-se da fraqueza que ele lhe mostra, ataca com força, obriga o adversário a receber a lei. Cumpre, pois, deixar cair todas essas idéias sem evocá-las, e dar toda a sua aplicação a ocupar-se com objetos úteis. Se, quando essas tentações passageiras se apresentam, simplesmente volvermos o nosso coração para Deus por um sentimento de piedade e sobretudo de amor, não receberemos dano algum.



(Livro Tratado das Tentações – PADRE MICHEL da Companhia de Jesus)

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