domingo, 14 de julho de 2013

O Marido - Os seus deveres ( Parte II )




O fim do matrimônio é receber. Mas quê? Vantagens puramente humanas, terrestres, frívolas, passageiras? Ah! Não, meus senhores. Há, entretanto, muitos homens que pensam
assim.

Há os que não vêem o matrimônio senão à sombra florida de não sei que Éden imaginário. Sonham com uma primavera eterna, sob o céu azul da Itália, uma adoração perpétua num ideal de amor, aonde a alegria dessa reciprocidade de afeto na doce intimidade do lar, não deixaria lugar nem aos cuidados, nem às tristezas, nem às provações da vida. - São os simples! O matrimônio não é somente poesia, ou romance.

Há outros que não procuram no matrimônio senão uma formalidade de convenção e conveniência, necessária para que a sociedade lhes conceda certos benefícios, para que os receba, nos seus salões e os dignifique aos olhos do mundo; mas sem lhes restringir, todavia, a liberdade e os prazeres. São os grosseiros, os homens sem lealdade, sem verdadeira honra! O matrimônio não é um simples costume, um pavilhão respeitável, uma etiqueta honesta, para encobrir o vício e a devassidão; nem tão pouco um fim, para os celibatários fartos de divertimentos.




Há outros que só vêem nele a aliança de duas raças, de dois nomes, de duas situações. São os espíritos levianos, superficiais! O matrimônio não é somente uma simples conveniência de famílias.
Outros só lhe pedem uma elevação de dignidade, de posição, de consideração humana, de classe social. São os ambiciosos! O matrimônio não é um estribo, uma escada, um elevador para subir na sociedade.

Outros não vêem senão o dinheiro, dote e esperanças. - Compreendo, quando se tem uma dignidade a sustentar, um nome a honrar, uma influência a manter, que se procure fortuna, - em si, isso não é repreensível, mas não será por isso, nem sobre isso que se concluirá o matrimônio: será uma simples condição, não um fim, nem objeto. O matrimônio não é um meio com modo para se enriquecer, um ajuste, uma especulação.

Enfim, para terminar esta triste enumeração, há outros que não procuram no matrimônio senão uma satisfação aos instintos menos nobres do ser humano. O físico, os sentidos, a matéria, é tudo para eles. - São os tacanhos, os aviltados, quando não são os libertinos e os devassos, atraídos pela emoção de uma sorte de voluptuosidade que a sua vida passada, por mais rica que haja sido em sensações desse gênero, não lhes pôde fazer conhecer, e pela miragem de uma fonte pura, aonde os seus sentidos estragados se vão fortalecer e remoçar como num orvalho fresco.

Deixar-se levar somente pelas suas paixões, em decisão tão grave, é, primeiramente, expor-se a decepções cruéis... há aparências tão enganadoras! ... é, em seguida, degradar-se. Só pensar em satisfazer os seus sentidos, não é o nobre matrimônio do homem, é o instinto do animal.

Que se deve então receber e, por conseguinte, procurar no matrimônio? Qual é o seu verdadeiro fim, o seu fim essencial e supremo?

É o próprio fim do homem. O matrimônio não foi instituído por Deus senão para auxiliar o homem a atingir o seu fim, o seu duplo fim: aperfeiçoar-se e multiplicar-se. Deixemos de parte o desenvolvimento da raça (de que falaremos), para não tratarmos senão do aperfeiçoamento do indivíduo. Em que consiste este aperfeiçoamento? Em concluir nele a semelhança divina, em aproximar-se do ideal divino, em desenvolver a sua inteligência, a sua vontade, o seu coração, no sentido de Deus, em tomar-se melhor e mais virtuoso, em glorifícara Deus, e salvar a alma, alcançando o Céu. Tal é o fim essencial da sociedade conjugai.

Para este progresso, para esta contínua ascensão para Deus, o homem necessitava da mulher. Segundo a palavra criadora, não era bom que ficasse só; precisava de uma companheira, uma associada, sociam, um auxiliar semelhante a si mesmo, adjutorium similesibi.

E porque o homem era incompleto. Tinha a majestade, a força, a energia; faltava-lhe alguma coisa da graça, da delicadeza, da sensibilidade, da doçura que Deus lhe queria dar. Faltava-lhe um ser semelhante a quem confiasse os seus sentimentos, com quem trocasse os seus pensamentos, fortalecesse e elevasse o seu coração expandindo: - a mulher.

Mas, meus senhores, como é que a mulher vai ajudar o homem a atingir seu fim, completá-lo e aperfeiçoá-lo?

Será tornando-lhe tudo fácil, tirando-lhe os espinhos e todas as pedras do caminho? É a ilusão de muitos maridos. Sustentados pela força inicial de sua primeira paixão, e no encanto de seu primeiro amor, nada lhes custa, e imaginam que a vida vai ser, para eles, um jardim de flores. A sua companheira parece-lhes ideal e encantadora, capaz de todos os sacrifícios, pronta a sofrer tudo por eles. A felicidade sorri-lhes com todo o esplendor num céu sem nuvens.

A ilusão vai muitas vezes até ao egoísmo. O homem pensa, com prazer, que a mulher foi criada para servi-lo; que tem direito a tudo, e dela exigir tudo; que a mulher foi feita para sofrer, e ele... para ser sofrido!

As dificuldades, porém, não tardam a aparecer. A mulher, por mais cheia de virtudes que seja (e que será se não possuir nenhuma?) conserva sempre alguns defeitos, alguns caprichos, os conformes à sua natureza, e ao seu caráter.

A oposição de idéias, os conflitos de opiniões, as discussões não tardam a surgir: são pequenas discórdias, ligeiras irritações, palavras um tanto exasperadas; alguns arrebatamentos e tudo isso que, não se tomando cuidado, se multiplica e desenvolve com uma rapidez prodigiosa.

Que resultará de tudo isto? O marido iludido ou egoísta porá a culpa em sua mulher; far-Ihe-á censuras amargas, attribuir-lhe-á todos os males. Se for indulgente será justo? -Parecer-lhe-á que acorda de um sonho, e que decididamente não há felicidade durável no matrimônio, que é preciso conformar-se com a sua sorte. Será isto verdade?

Não. Nem é justo nem verdadeiro. Há uma felicidade cristã muito sólida e muito durável no matrimônio, e nem sempre é culpa das mulheres, se a não encontram; às vezes é culpa dos maridos, quase sempre de ambos. Não se compreende o fim do matrimônio. Esperando encontrar só alegrias, ficam espantados de que se lhes deparem provações.

Estas provações são providenciais, e é por meio delas, sobretudo, que o matrimônio atingirá o seu fim, e que, cada um dos esposos, receberá o seu aperfeiçoamento, se compreender o seu papel.

O marido cristão queixar-se-á primeiro de si mesmo. Sem renunciar absolutamente a felicidade, mas, pelo contrário, para conservá-la com mais segurança em seu lar, dir-se-á que a felicidade está no dever, e que é ao dever que ele tem de apegar-se com toda a energia de sua Fé, e todas as forças de seu coração. O seu dever, é subir, aperfeiçoar-se, tornar-se melhor. Mas, para isso, duas coisas lhe parecem de necessidade evidente: conhecer-se e dominar-se a si próprio. Eis aí toda a moral! E esta ciência, esta vitória, é o matrimônio que lhas dá.

Até aí, não se conhecia a si mesmo. Seus pais, os seus professores, haviam-no repreendido; os seus amigos haviam-lhe apontado os defeitos, e talvez tivessem zombado dele! Mas nada havia podido fazer cair o véu espesso que os melhores se obstinam em conservar, e que impede que se vejam.
O sentimento de sua responsabilidade começará a abrir-lhe os olhos. Se quiser ser sincero, há de sentir-se impotente para fazer a felicidade daquela que ele ama!...

Em seguida, na intimidade da vida conjugai, no contato diário, nas decisões a tomar em comum na fusão das duas existências, o fundo da sua natureza depressa se revelará. Admirar-se-á de descobrir em si defeitos que não conhecia, porque lhes faltara ocasião de se produzirem.

Além disso, se não quiser entrincheirar-se em seu orgulho, não receará de aceitar os conselhos de sua mulher; não há de querer privar-se de luzes tão preciosas. Se a mulher tem menos conhecimento e talvez menos razão, tem mais coração e perspicácia. Um marido que rejeitasse os seus conselhos ou que a desanimasse de renová-los, pelo seu mau acolhimento, não sabe de que luzes e, quase, de que revelações o seu estúpido amor próprio o privaria para sempre. Quem poderá melhor do que a mulher conhecer o temperamento do marido notar-lhe e fazer-lhe compreender os seus defeitos? É ao marido que compete fazê-lo em primeiro lugar; mas os conselhos de sua afetuosa franqueza terão um acolhimento tanto maior, quanto mais pronto ele estiver para recebê-los com cordial gratidão e docilidade generosa.

Não se deve desacorçoar do papel de monitor, porque, se é alívio o dizer uma verdade no arrebatamento da cólera, é uma aflição, e é preciso um esforço, na calma de uma afeição, que deseja o bem sem paixão nem rancor.



(Livro O marido, o pai e o apóstolo – Escravas de Maria)

Nenhum comentário:

Postar um comentário