domingo, 4 de agosto de 2013

Décimo Primeiro Domingo Depois de Pentecostes.



O milagre do surdo-mudo e os espiritualmente mudos


Adducunt ei surdum et mutum, et deprecabantur eum, ut imponat illi manum“Trazem-lhe um surdo-mudo, e lhe rogaram que pusesse a mão sobre ele” (Marc. 7, 32).

Sumário. Os espiritualmente mudos não são somente aqueles cristãos que calam os pecados na confissão, mas também os que não se recomendam a Deus, não descobrem todo o seu interior ao Diretor, deixam de corrigir seus súditos, ou descuidam de comunicar ao Superior as desordens ocultas da comunidade. Examinemos a nossa consciência e, se descobrirmos em nós alguma destas mudezes, roguemos ao Senhor queira renovar em nosso espírito o milagre feito a favor do mudo do Evangelho.


I. Refere o Evangelho que trouxeram para Jesus um surdo-mudo e lhe rogaram pusesse a mão sobre ele. Jesus tirou-o do meio da multidão, tomou-o à parte, pôs-lhe os dedos nos ouvidos e tocando com sua saliva a língua do surdo-mudo, levantando os olhos ao céu, suspirou e disse: Ephphetha, isto é, abri-vos. Logo os ouvidos deste homem se abriram, sua língua desatou-se e ele falava distintamente. Jesus lhes ordenou que nada dissessem a ninguém, Mas, quanto mais recomendava, mais o publicavam; e cheios da mais viva admiração diziam: “Ele fez bem tudo, fez ouvir os surdos, e falar os mudos” - Surdos fecit audire et mutos loqui.

Seria para desejar que o Senhor renovasse o milagre que fez a favor do infeliz mudo corporalmente, a favor de tantos outros infelizes que são mudos espiritualmente. Semelhantes espiritualmente mudos são em primeiro lugar os que calam pecados na confissão, ou que acusam só pela metade os pecados mais vergonhosos, que não tiveram pejo de cometer, de sorte que o ministro de Deus os não pode entender. - São em segundo lugar aqueles que deixam de descobrir ao Diretor espiritual todo o seu interior e especialmente as tentações, que talvez tivessem de cessar, se eles falassem. - São em terceiro lugar aqueles que se descuidam de admoestar ou repreender os seus súditos, ou descuram de informar os superiores acerca das desordens de uma comunidade, afim de que as possam remediar. - Finalmente, são mudos espiritualmente todos os que nas necessidades da alma ou do corpo deixam de recorrer a Deus pela oração.

Examina-te aqui meu irmão, afim de ver se em ti se acha uma destas mudezes espirituais, e se for este o caso, apresenta-te a Jesus Cristo, e roga lhe que te solte a língua.

II. Para cura dos espiritualmente mudos é necessário, como fez Jesus Cristo com o surdo mudo, tirá-los à parte, do meio de tantas distrações mundanas, e antes de lhes desatar a língua, abrir-lhes os ouvidos, para que compreendam os graves males que atraem sobre si.

Quem sofre a tentação de ocultar os pecados na confissão, pondere que deste modo muda em veneno o sangue de Jesus Cristo e agrava a sua alma de sacrilégios horrorosos. - Quem não abre o interior ao Diretor, virá em breve a cair em pecado; porque o Senhor retirará sua luz e a tentação irá ganhando força. Quem com seu silêncio coopera para as desordens do próximo, as quais poderia remediar falando, lembre-se de que tais desordens lhe serão imputadas e que um dia será punido com todo o rigor.

Enfim, os que descuidam de pedir auxílio a Deus pela oração, estejam persuadidos de que desta forma se expõem ao perigo certo de caírem no inferno, pois o que não reza, certamente se condena. - Numa palavra, mais cedo ou mais tarde todos aqueles mudos espiritualmente terão de dizer com o profeta: “Ai de mim, porque fiquei calado” - Vae mihi, quia tacui (1).

Ó meu amabilíssimo Jesus, Vós que restituístes o ouvido aos surdos e a fala aos mudos, dignai-Vos abrir os nossos ouvidos e desatar a nossa língua, afim de que, compreendendo os embustes com que o demônio nos quer impor silêncio, comecemos, à imitação do mudo do Evangelho, a falar bem e digamos com a multidão cheia de admiração pelo vosso poder: Ele tudo tem feito bem: fez os surdos ouvir e os mudos falar. - Peço-Vos também, ó meu Senhor, “que derrameis abundantemente sobre mim a vossa misericórdia; perdoai-me o que a consciência teme e acrescentai ao perdão o que por minhas orações não presumo alcançar” (2). Fazei-o pelo amor de Maria Santíssima.

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1. Is 6, 5.
2. Or. Dom. curr.
  
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Décima Segunda Semana depois de Pentecostes até o fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 1-3.)

Fonte: São Pio V

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