sexta-feira, 20 de abril de 2012

Dever de Obedecer – Dever de Desobedecer


Famosos Teólogos Concordam:
Fiéis devem Resistir aos Maus Pastores

[Tradução: Gil Dias]


Em resposta ao grande interesse que os nossos leitores estão mostrando pela fundamentação da nossa posição de resistência contra as autoridades progressistas, citamos os mais famosos autores, os quais aconselham os Católicos a resistirem respeitosamente às más autoridades religiosas.

Padre Francisco Suárez, S.J.

Se [o Papa] der uma ordem contrária aos bons costumes, não deve ser obedecido; se tentar fazer alguma coisa oposta à justiça e ao bem comum, é lícito resistir-lhe; se atacar pela força, pela força deve ser repelido, com moderação adequada a uma justa defesa (De Fide, disp. X, sec. VI, n.16, inOpera omnia, Paris: Vivès, 1958, vol. 12, p. 321).

Padre Cornelius a Lapide, S.J.

O famoso Jesuíta demonstra que Santo Agostinho, Santo Ambrósio, Santo Bede, Santo Anselmo e outros Padres ensinam que São Paulo resistiu publicamente a São Pedro, “para que o escândalo público dado por São Pedro fosse emendado por uma igual repreensão pública” (Commentaria in Scripturam Sacram, Ad Galatas 2:11, Paris: Ludovicus Vivès, 1876, vol. 18, p. 528).
Mais tarde, Lapide argumenta que “os superiores podem ser repreendidos, com humilde caridade, pelos seus subordinados, na defesa da verdade; é o que Santo Agostinho (Epistula 19), São Cipriano, São Gregório, São Tomás e outros acima citados declaram acerca desta passagem (Gal. 2, 11). Ensinam claramente que São Pedro, sendo superior, foi repreendido por São Paulo… Com boa razão, por conseguinte, diz São Gregório: “Pedro fiou em silêncio porque, sendo o primeiro na Jerarquia Apostólica, também devia ser o primeiro em humildade” (Homilia 18 in Ezechielem).
E Santo Agostinho escreveu: “Ensinando que os superiores não devem recusar ser repreendidos pelos inferiores, São Pedro deu à posteridade um muito mais raro e santo exemplo do que o de São Paulo, dado que ensinou que, na defesa da verdade com caridade, os inferiores devem ter audácia para, sem medo, resistir aos superiores (Epistula 19 ad Hieronyrnum).

Dom Prosper Guéranger, Abade de Solesmes

Quando o pastor se torna lobo, é dever do rebanho, primeiro, defender-se. Normalmente, a doutrina flui dos Bispos para o povo fiel, e os súbditos não devem julgar os seus chefes. Mas, no tesouro da Revelação, existem certos pontos que cada Cristão necessariamente conhece, e deve obrigatoriamente defender (L’année liturgique - Le temps de la septuagesime, Tours: Maison Mame, 1932, pp. 340-341).

Padres Francisco Wernz S.J. e Pedro Vidal, S.J.

Estes famosos teólogos do início do século XX, citando Suarez, admitem a licitude de resistir a um mau Papa: “Os meios justos a ser usados contra um mau Papa são, de acordo com Suarez (Defensio Fidei Catholicae, lib. IV, cap. 6, nn. 17-18), a mais abundante assistência da graça de Deus, a especial protecção pessoal do Anjo da Guarda, a oração da Igreja Universal, a admoestação ou correcção fraterna em privado ou mesmo em público, bem como a legítima defesa contra a agressão, quer física, quer moral (Ius canonicum, Roma: Aedes Universitatis Gregorianae, 1927, vol. II. p. 436).

Padre António Peinador, C.M.F.

Este bem conhecido teólogo espanhol, pré-Vaticano II, adopta as afirmações daqueles que o precederam: “Também um súbdito pode ser obrigado a corrigir fraternalmente o seu superior (Summa Theologiae, II-II, q.33, a.4). Porque também o superior pode ser espiritualmente indigente, e nada o impede de ser libertado de tal indigência pelos seus súbditos.” Todavia, “na correcção pela qual os súbditos repreendem os seus Prelados, devem actuar de maneira apropriada, isto é, sem insolência e aspereza, mas com docilidade e reverência (ad 2)” (Cursus brevior Theologiae Moralis, Madrid: Coculsa, 1946, vol. I, p. 287).


Resistir a um Papa não é julgá-lo

Nos meios conservadores e tradicionalistas encontramo-nos entre duas semelhantes posições erradas. Por um lado, existem aqueles conservadores que cegamente aceitam e obedecem a tudo o que os Papas Conciliares fazem ou dizem, apenas porque são Papas, sem analisar a inaudita destruição da Igreja Católica que eles promovem. Estes conservadores acusam os que analisam e resistem a esta destruição de “julgarem o Papa”. O acto de julgar o Papa, proibido aos fiéis, contudo, é a acção de qualquer autoridade – seja religiosa ou civil – que pretenda ser superior ao Papa no campo jurídico e, portanto, reclama o direito de o julgar, punir ou depor.
Para refutar esta errada posição, apresentamos a seguir o texto de São Roberto Belarmino, no qual claramente instrui que devemos analisar as acções do Papa e resistir àquelas que estão a destruir a Igreja. Esta acção não se considera como julgando o Papa.
Por outro lado, existem tradicionalistas que consideram que os Papas Conciliares praticaram tal destruição que cessam de ser Papas. É esta a posição do movimento designado Sedevacantismo. Os que aderem a esta posição consideram-se como juízes de facto dos Papas, quando entram na esfera jurídica, para declarar que os Papas não são válidos. São Roberto Belarmino também lhes responde que ensina os Católicos a resistirem a um mau Papa, mas não a julgá-lo, puni-lo ou depô-lo.


São Roberto Belarmino

“Tal como é lícito resistir ao Pontífice que agride o corpo, também é lícito resistir ao que agride as almas ou perturbe a ordem civil, ou, acima de tudo, que tente destruir a Igreja. Digo que é lícito resistir-lhe não fazendo o que ele ordena e evitando que a sua vontade seja executada; contudo, não é lícito julgá-lo, puni-lo ou depô-lo, dado que tais actos são próprios de um superior” (De Romano Pontifice, lib. 2, chap. 29, Opera omnia, Paris: Pedone Lauriel, 1871, vol. 1, p. 418).

É Lícito Resistir ao Papa
Que Publicamente Destrua a Igreja

Chamamos a atenção dos nossos leitores para algumas considerações do Padre Francisco de Vitória, O.P., um dos grandes nomes da Escolástica Espanhola da época de Prata do século XVI e famoso jurista da Escola de Salamanca. Foi um dos primeiros especialistas em lei internacional, defendendo o proeminente e decisivo papel do Papa como árbitro de todos os Monarcas Católicos. Apesar disso, também estudou casos nos quais é lícito e necessário resistir ao Papa. Afirma que os Católicos são obrigados a assumir posição de resistência contra um Papa que abertamente destrua a Igreja e nela introduza maus costumes.


Padre Francisco de Vitória, O.P.

“Caietano, na mesma obra em que defende a superioridade do Papa sobre o Concílio, diz no cap. 27: ‘Por conseguinte, deve-se resistir ao Papa que publicamente destrua a Igreja, por exemplo, ao recusar conceder benefícios eclesiásticos excepto por dinheiro, ou em troca de serviços; e com toda a obediência e respeito, a posse desses benefícios deve ser negada àqueles que os compraram’.
“E Silvestre (Prierias), na entrada Papa, § 4, pergunta: ‘O que deve sere feito quando o Papa, por causa dos seus maus costumes, destrói a Igreja?’ E, no § 15: ‘O que deve ser feito se o Papa quiser, sem razão, abrogar a Lei Positiva?’ Ao que ele responde: ‘Certamente pecará; não lhe deve ser permitido agir dessa maneira, nem deve ser obedecido no que é mau; mas deve-se-lhe resistir com repreensão cortês.’
“Consequentemente, se ele quer dar todo o tesouro da Igreja ou o património de São Pedro aos seus familiares, se quer destruir a Igreja ou parecido, não lhe deve ser permitido agir dessa maneira, mas o fiel deve ser obrigado a resistir-lhe. A razão é que o Papa não tem o poder para destruir; por consequência, se é evidente que está a fazê-lo, é lícito resistir-lhe.
“O resultado de tudo isto é que, se o Papa destrói a Igreja com as suas ordens e acções, pode-se-lhe resistir e evitar a execução dos seus mandados…
“Segunda prova da tese: pela Lei Natural é lícito repelir violência com violência. Então, com tais ordens e escusas o Papa exerce violência, dado que age contra a Lei, como provámos. Por conseguinte, é lícito resistir-lhe.
“Como observa Caietano, não afirmamos tudo isto no sentido de que alguém tenha competência para julgar o Papa ou tenha autoridade sobre ele, mas querendo significar que a defesa é lícita. De facto, cada um tem o direito de resistir a um acto injusto, tentar evitá-lo e defender-se a si próprio”(Obras de Francisco de Vitoria, Madrid: BAC, 1960, pp. 486-487)


Os Católicos Devem Resistir a um Papa Infiel

Alguns Católicos conservadores têm um problema de consciência sobre criticar os Papas Conciliares, quando estes ensinam ou agem contra a estabelecida Tradição da Igreja e o ensino constante do Magistério papal anterior. Para estes Católicos, quaisquer palavras de censura ou desaprovação caem sob a condenação de “julgar o Papa.”
Eles não pensam que o que está proibido nessa condenação é um concílio, ou um Rei, ou um Imperador declararem inválido o Papa e depô-lo das suas funções. Quando um Papa actua escandalosamente, como Alexandre VI na Renascença, ou João Paulo II recentemente, os fiéis não estão proibidos de ver e falar sobre o que é absolutamente errado, de acordo com a Moral e a Fé Católicas.
Pelo contrário, têm o dever de observar cuidadosamente as suas acções e analisá-las. Se algo está em conflito com o Magistério anterior, deve-se-lhe resistir não obedecendo e avisando outros para fazerem o mesmo. Isto não é “julgar o Papa”, dado que não se pretende declará-lo Papa inválido.
Resistir a um mau Papa é seguir a orientação de grandes Santos e Doutores da Igreja, como Santo Tomás d’Aquino.

São Tomás d’Aquino

Em muitas passagens de suas obras, São Tomás defende o princípio de os fiéis poderem questionar e admoestar Prelados. Por exemplo:
“Surgindo perigo iminente pára a Fé, os Prelados devem ser questionados, mesmo publicamente, pelos seus súbditos. Assim, São Paulo, que estava sujeito a São Pedro, questionou-o publicamente pelo iminente perigo de escândalo em matéria de Fé. E, tal como Santo Agostinho o interpreta na sua Glosa (Ad Galatas 2, 14), ‘São Pedro deu o exemplo a todos os que governam para que, ao desviarem-se do caminho recto, não rejeitem a correcção como inútil, ainda que venha de súbditos’” (Summa Theologiae, Turin/Rome: Marietti, 1948, II-II, q.33, a.4).
Referindo o mesmo episódio, no qual São Paulo resistiu a São Pedro frontalmente, São Tomás ensina:
“A repreensão foi justa e útil e a sua razão não era leve. Existia perigo para a verdade evangélica… O modo como se realizou foi adequado, dado que o perigo era público e manifesto. Por esta razão, São Paulo escreve: ‘Falei com Cefas’, isto é, Pedro, ‘antes de alguém’, dado que a simulação praticada por São Pedro estava repleta de perigo para todos. Em 1 Tim 5, 20, lê-se: ‘Admoesta, antes de ninguém, aquele que peca.’ Isto deve ser entendido como referindo-se a pecados manifestos, não aos escondidos, já que nestes últimos casos se deve proceder de acordo com as regras próprias da correcção fraterna’” (Super Epistulas S. Pauli, Ad Galatas, 2, 11-14, lec. III, Turim/Roma: Marietti, 1953, nn. 83-84).
O Doutor Angélico também mostra como esta passagem das Escrituras contém ensinamentos não só para os Jerarcas, como também para os fiéis:
“Foi dado aos Prelados um exemplo de humildade, para que eles não recusem aceitar correcções dos seus inferiores e súbditos; e, aos súbditos, um exemplo de zelo e liberdade, para que não temam corrigir os seus Prelados, sobretudo quando o crime é público e vincula perigo para muitos” (ibid. Nº 77).
Nos seus Comments on the Sentences of Peter Lombard, São Tomás ensina como, corrigir respeitosamente um Prelado que peca, é uma obra de misericórdia tão grande quanto a posição elevada do Jerarca:
“A correcção fraterna, sendo uma esmola espiritual, é uma obra de misericórdia. Mas a misericórdia é devida principalmente ao Prelado, dado que corre o perigo maior. Daí Santo Agostinho dizer em Regula (nº 11, PL 32, 1384): ‘Tende piedade não só de vós próprios, mas também deles’, isto é, dos Prelados, ‘entre vós, que correm um perigo tão grande como a posição que ocupam’. Portanto, a correcção fraterna estende-se também aos Prelados.
“Além disso, Ecclus. 17, 12, diz que Deus ‘deu a cada um mandamento a respeito do seu próximo’. Ora, um Prelado é nosso próximo. Assim, devemos corrigi-lo quando peca… Alguns dizem que a correcção fraterna não se estende aos Prelados, seja porque o homem não pode erguer a sua voz contra o Céu, seja porque os Prelados facilmente se escandalizam se corrigidos pelos seus súbditos. Contudo, tal não sucede, dado que, quando pecam, os Prelados não representam o Céu e, daí, devam ser corrigidos. E aqueles que os corrigem caridosamente não levantam a sua voz contra eles, mas em seu favor, dado que a admoestação é para seu próprio bem.
“Por esta razão, de acordo com outros [autores], o preceito da correcção fraterna também se estende aos Prelados, que podem ser corrigidos pelos seus súbditos” (IV Sententiarum, d. 19, q. 2, a. 2).

Devemos Atacar e Desacreditar o Agente do Erro

“No combate ao erro é errado e não caridoso atacar a pessoa que o comete”. É contra este ‘dogma’ liberal, tão frequente nos nossos meios Católicos, que o Padre Felix Sardá y Salvani argumenta. Prova que é indispensável atacar os que promovem erros; de outro modo, não se defende com eficácia a causa Católica.


Padre Felix Sardá y Salvani

Os apologistas Católicos são acusados, com frequência, de fazer ataques pessoais durante os debates. E quando liberais ou aqueles influenciados pelo Liberalismo, lançam esta acusação contra um de nós, pensam que ela é bastante para o condenar.
Mas enganam-se a si próprios. Para combater e desacreditar as falsas ideias, temos de as fazer parecer repugnantes e desprezíveis à mesma multidão que tentam convencer e seduzir. Acontece que as ideias não podem suster-se no ar por si próprias, nem se espalham e propagam por si próprias. Deixadas a si mesmas, nunca produzirão todo o mal que prejudica a sociedade. É só quando são aplicadas pelos que as concebem que elas produzem efeito. As ideias são como as flechas e as balas, que não atingem ninguém se não foram lançadas pelo arco ou disparadas pela espingarda. Portanto, é o arqueiro e o atirador que devem ser os nossos primeiros alvos, se queremos derrotar aquele inimigo. Qualquer outro modo de travar a guerra, liberal ou não, não tem sentido.
Os autores e propagadores de doutrinas heréticas são soldados com espingardas envenenadas nas suas mãos. As suas armas são livros, jornais, discursos públicos e a sua influência pessoal. Não basta esquivar-se às balas que atiram. A primeira coisa necessária é inutilizar o próprio atirador, para que não possa provocar mais danos.
Portanto, devemos não só desacreditar o livro, jornal ou discurso do inimigo, mas também, em alguns casos, desacreditar a sua pessoa. Porque, em guerra, o principal elemento de combate é a pessoa empenhada, tal como o artilheiro é o principal factor num combate de artilharia e não o canhão, a pólvora ou a granada.
Assim, é lícito em certos casos expor publicamente a infâmia de um opositor liberal, ridicularizar os seus costumes, arrastar o seu nome na lama. Sim, tal é totalmente permitido, permitido em prosa, em verso, em cenas trocistas, em caricatura, ou quaisquer meios e métodos ao alcance presentemente ou no futuro. O único cuidado a ter é não utilizar uma mentira no serviço da justiça. Isto, nunca! Sob nenhum pretexto devemos manchar a verdade, sequer pela pinta de um i.

Os Padres da Igreja apoiam esta tese. Os títulos das suas sobras mostram claramente que, no seu combate contra as heresias, o primeiro golpe era contra os heresiarcas. Quase todos os títulos de obras de Santo Agostinho ostentam o nome do autor da heresia contra a qual foram escritas:Adversus (Contra) Fortunatum, Adversus Faustum Manichaeum, Adversus Adamanctum, Adversus Felicem, Adversus Secundinum. Ou, Quis fuerit Petriamus (Quem é Petrianus?), De gestis Pelagii (Dos feitos de Pelágio), Quis fuerit Julianus, etc..
Assim se vê que a maior parte das polémicas do grane Agostinho era pessoal, agressiva, bem como biográfica e doutrinal, uma luta corpo-a-corpo contra heréticos bem como contra a heresia. Podemos dizer o mesmo quanto aos outros Padres da Igreja.
Que direito têm os Liberais de nos impor a obrigação de lutar contra o erro apenas em abstracto e com pródigos sorrisos e lisonjas para com eles? Deixem os Ultramontanosdefender a Fé de acordo com a polémica tradição Católica – directo ao coração! Este é o único, real e eficaz modo de combater!
(Felix Sardá y Salvani, El Liberalism es pecado, Barcelona: 1960, pp. 60-62)

* Ultramontano – do lat. ultramontanus. Os ultramontanos defendem o pleno poder e a infalibilidade dos Papas em matéria de Fé. O conceito está ultrapassado pela definição de Tradicionalista – N.T.


O Pecado de Estar Calado

Com a crescente apostasia na Igreja, vemos muitos “conservadores” e “tradicionalistas” que evitam criticar os Prelados, e até os Papas, e assim se tornam cúmplices da apostasia. Fogem da sua obrigação de avisar os outros sobre a gravidade da situação.
Reforçando a importância deste dever, apresentamos hoje as palavras de Frei Vincent de Beauvais, um estudioso Dominicano consultado frequentemente por São Luís IX, Rei de França. Este monge foi autor de um compêndio de todo o conhecimento do seu tempo respeitante à Doutrina, História e Natureza, intitulado Speculum Maius – O Grande Espelho. As palavras que seguem são desta famosa obra.


Vincent of Beauvais

Tratando do peccatum taciturnitatis (pecado do silêncio) em geral, Vincent de Beauvais explica esta grave falta moral: “A seguir devemos considerar o silêncio. É sabido que o excesso de loquacidade é um vício; também o é, por vezes, o excessivo silêncio. De facto, ‘há um tempo de estar calado e um tempo de falar’ (Ecl. 3, 7); Santo Isidoro: ‘A língua deve ser vigiada, mas não inflexivelmente parada’. Porque é um vício, ao permanecer em silêncio, permitir a alguém indigno e impreparado ser escolhido para promoções e honrarias, ou permitir que alguém digno perca a sua dignidade, bens e honraria.
“O mesmo deve ser dito se, em reuniões do conselho, alguém fica calado por ignorância ou malícia e, deste modo, esconde a verdade aos restantes conselheiros. De igual modo, durante uma sessão de tribunal, ao ver-se alguém lançar acusação fraudulenta ou ser injustamente condenado, peca-se por silêncio. E se não se repreende os detractores que difamam outros em conversas, sem desculpar ou louvar a pessoa difamada, peca-se ao permanecer em silêncio. De igual modo, ao entender que é necessária uma palavra para instruir, exortar ou corrigir alguém, comete-se pecado ao não dar um são conselho. Isaías exclamou: ‘Desgraçado de mim, porque contive os meus passos’ (6, 5). O mesmo está dito no Eclesiástico: ‘Não retenhas a palavra em tempo oportuno’ (4, 23)”.
Este mandamento é dirigido em primeiro lugar aos Jerarcas e clérigos que ficam calados. Contudo, a sua defecção obriga os leigos a falar, visto que Vincent de Beauvais, a seguir citado, usa o advérbio especialmente quando se refere aos Prelados, o que significa que aqueles que não estão revestidos da dignidade sacerdotal têm dever análogo.
“Tal é obrigatório especialmente para os Prelados e todos aqueles que dirigem ou cuidam das almas. Está claramente afirmado em Êxodo, 28, cujo preceito diz que se coloquem pequenas campainhas alternadas com romãs pendentes das casulas sacerdotais, para que o sacerdote seja ouvido ao entrar ou sair do santuário e assim não morra. São Gregório explica isto, dizendo: ‘O sacerdote que entra morrerá se o som não for ouvido, porque atrairá a si a ira do Juiz Eterno se o som da pregação não vier de si.’ De igual modo, Ezequiel, 33, 6: ‘Mas se a sentinela, vendo chegar a espada, não tocar a trombeta, de sorte que o povo não é alertado e, chegando a espada, fere a algum deles, este ficará, sim, preso na sua própria iniquidade, mas a sentinela responderá pelo seu sangue’.”
(Vincent of Beauvais, Speculum quadruplex sive speculum maius, Graz, Akademische Druck Verlagsanstalt, 1964, col. 1228)

[TIA – Tradition in Action ]

 Fonte: SPES

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