quarta-feira, 21 de março de 2012

A Subida do Calvário - II. AS PEDRAS DA TORRENTE DE CEDRON

 
PRIMEIRA PARTE
OS INSTRUMENTOS DE SUPLÍCIO
 
II - AS PEDRAS DA TORRENTE DE CEDRON




Ao sair do horto, a tropa que arrasta a Jesus atado vai-se desordenada, tumultuosa, apressada. Eles ainda não estão inteiramente tranqüilos sobre aquela captura; vão o mais apressadamente possível, pelo mais curto caminho.

É uma vereda, talhada no rochedo, que corta a torrente do Cedron abaixo da estrada e da ponte.

Os pés dos que vão derramar sangue, diz o Espírito Santo, são sempre apressados (Sl 13, 3): quando uma paixão nos senhorea, arrasta-nos. Mostra essa pressa que o homem perdeu o domínio de si mesmo... é escravo. Marcha! clama a paixão... e fustiga-o a golpes redobrados de maus desejos.

Jesus é, pois, levado; é encontrado, sacudido, empuxado para a direita e para a esquerda pelas cordas: tem todo um luxo de laços em volta do pescoço, em torno do busto.

Em descendo a vereda talhada em escada, cambalea e cai no rochedo – segundo uma antiga tradição.

Há desordem, gritos e confusão. Os que estão na frente, e que a carreira projeta, recuam; os que estão atrás caem quase sobre o corpo de Jesus.

Bateu Ele com os joelhos e com a cabeça no rochedo, e o rochedo não amoleceu.

No dia da Sua Ascensão Ele fará ceder, sob a última pressão do pé glorificado, a rocha insensível, e a gente beijará [na Terra Santa] com amor essa derradeira pegada humana do Salvador.

No dia da Paixão, a natureza permanece o que é: dura, cruel para o pecador universal; no mínimo é indiferente. É mister saber sofrer neste mundo dessa indiferença das coisas.

Que deferências merecemos nós? Que exceção em nosso favor? O frio, o calor, o vento, a chuva, tudo isto tem que me importunar a seu tempo: porque me queixar?

Há nas nossas impaciências a respeito dos sofrimentos que nos vêm das coisas uma espécie de orgulho secreto: queremos o privilégio, a exceção para nós; afigura-se-nos estranho que alguma coisa nos moleste sem a nossa permissão, sem o nosso justo consentimento.

Deus não fez milagre em favor de Seu Filho que entra na Paixão. Ele cai, bate de encontro no rochedo, fere-se. Levantam-no, porque o não pode fazer por si mesmo. E Ele aceita o auxílio, como aceitou o golpe.

Tudo isto entra no plano superior do Pai: não Lhe quer Ele tocar, receiaria estragar um dos instrumentos do suplício, pois tudo é instrumento entre as mãos do Deus irritado.

O medo, o tédio, o pavor que o fizeram suar sangue.
A gruta silenciosa, indiferente também ela àquele sangue que corre.

A pedra da torrente, e em breve os escarros da criadagem que bebe e que blasfema, como depois as correias dos flagelos e os pregos da Cruz.

Ó Justiça de Deus!...
 
(A Subida do Calvário) 

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